quinta-feira, 11 de agosto de 2011

Santa Clara e a dimensão erótico/esponsal da espiritualidade cristã


No estágio final do “mytho” grego de Eros, o deus do amor aparece como o mais fiel dos esposos do Olympo. A imagética grega desvela assim que o anseio mais profundo do coração humano, erótico no sentido amplo do termo, destina-se a esponsalidade, não a dispersão.

Em tempos modernos, quando a religião parece agarrar-se a moral como baluarte de sua existência ou justifica exclusão e violência “em nome de Deus”, parece oportuno lembrar, quando a Igreja celebra a Memória de Santa Clara, a dimensão erótico/esponsal da espiritualidade cristã.

A liberdade do místico transparece no modo com que ele brinca com a rigidez de nossos conceitos. É significativo que Clara, descrevendo sua filiação espiritual ao caminho franciscano, recorra a uma imagem que “subverte” os papéis de gênero. Nela, São Francisco aparece como uma mãe, que, expondo seu seio, amamenta-a com a doçura celeste de sua doutrina. Aliás, não custa lembrar que o pobrezinho de Assis descrevia a si mesmo como uma mãe para seus frades e desejava que todo Superior de sua fraternidade assim o fosse.

Tal originalidade é fruto de um Eros assumido e desposado, “agapicamente erótico”, cuja tradução se revela na alegria de saber-se amado e amar; na criatividade em criar pontes no acolhimento de todo outro; no maravilhamento de descobrir a unidade na diversidade.

Nem lei nem doutrina. O essencial da vida cristã é uma Pessoa, Jesus Cristo. Pessoa que é relação e nos convida a relação. O mesmo amor que anseia pela comunhão, lança fora os medos que provocam as divisões –“ já não há homem nem mulher, sois todos vós um em Cristo”. Tira-nos da pseudo segurança da moral e nos expõe a vulnerabilidade da acolhida.

Que Santa Clara, Mestra de uma espiritualidade a um só tempo estática e extática – centrada no Único necessário e constantemente saindo de si ao encontro de Deus e do próximo – nos ajude a encontrar o júbilo de sabermo-nos todos criados pelo mesmo Amor e exclamar com gratidão: “Senhor, sede bendito, porque me criastes!”

- Thiago Lins

* * *

Repitamos hoje com Santa Clara:
“Senhor, sede bendito, porque me criastes!”

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